Cinco lideranças de comunidades que decidiram abraçar o turismo indígena de base comunitária se reuniram pela primeira vez, em São Paulo, para compartilhar experiências, discutir a relação com agências e operadoras de turismo e contar como a atividade é vista por seus povos.
O evento Turismo Indígena: oportunidade para fazer amigos, gerar renda e proteger o território, realizado pela ONG Garupa e pelo Instituto Socioambiental (ISA) no Unibes Cultural, em São Paulo, mostrou que mesmo como uma atividade recente há uma diversidade de iniciativas que ganhou corpo nos últimos anos com a regulamentação da Funai, publicada em 2015.
“É importante dar mais visibilidade e entendimento sobre o que é o turismo indígena, que tem potencial para promover o bem estar das comunidades indígenas”, afirma Marcos Wesley de Oliveira, coordenador do Programa Rio Negro do ISA.
Para Monica Barroso, diretora-executiva da Garupa, o encontro foi uma “rara oportunidade de escuta e aprendizado com lideranças indígenas.” “Mais do que desafios, pudemos tatear um novo campo de possibilidades que convida a todos, comunidades, operadoras, viajantes, a repensar crenças, práticas e relações”, afirma.
De xamanismo a escalada, de pesca esportiva a imersões culturais, os roteiros de turismo indígena de base comunitária partem do interesse das comunidades em desenvolver uma atividade que valorize a cultura, seja uma alternativa de renda, engaje jovens e tenha como resultado a proteção de seus territórios.
Para as lideranças presentes, o turismo é uma oportunidade de gerar renda, fazer amigos e principalmente romper com preconceitos. “A gente não quer viver do turismo. A gente quer formar pessoas. Mudar o olhar preconceituoso, estereotipado”, afirmou Tiago Karai, do povo Guarani Mbya, Terra Indígena Tenondé Porã (SP). “O turista deve sair da experiência com outra visão sobre o que é a vida na aldeia”, resumiu Dina Yawanawá, do povo Yawanawá, Terra Indígena Rio Gregório (AC).
Regulamentação e protagonismo indígena
Entre as lideranças, o protagonismo indígena vem para superar um problema antigo vivido pelas comunidades. O turismo em Terras Indígenas, concordaram, sempre aconteceu sem regulamentação e, muitas vezes, explorado por agências atuando como atravessadores, com falta de transparência.
“Em muitas Terras Indígenas o turismo já acontecia com determinantes de fora para dentro”, afirmou José Augusto Lopes Pereira, da Coordenação-Geral de Promoção ao Etnodesenvolvimento da Funai. “A gente optou por conhecer o que estava acontecendo.”
Os Planos de Visitação, redigidos pelas comunidades e obrigatórios para iniciar a atividade, criam condições para que os indígenas sejam autores dos roteiros de visitação, desde sua concepção até o receptivo. Os documentos detalham as atividades a serem realizadas, com público-alvo, quantidade máxima de visitantes, distribuição do trabalho nas comunidades, manual de conduta e plano de negócios.
“O projeto deve melhorar a vida da comunidade e não afetar a cultura originária”, disse Salomão Ramos Yanomami, da comunidade Maturacá, Terra Indígena Yanomami (AM). Ele é o coordenador do projeto Yaripo, como é chamado o Pico da Neblina na língua Yanomami. “Agora a gente tem controle, faz a vigilância do rio. Todos que trabalham com turismo gostam muito”, relata Jaciel Manoel Rodrigues, do projeto Serras Guerreiras de Tapuruquara, nas Terras Indígenas Médio Rio Negro I e II (AM).
Roberto Pereira Lopes relembrou como empresas exploravam de forma desordenada o rio Marié, Terra Indígena Médio Rio Negro I (AM), sem estudos de capacidade de pesca, monitoramento ou fiscalização. “As escolas eram barraquinhas, agora temos um bom centro comunitário, compramos painéis solares e radiofonia”, afirmou.
O evento Turismo Indígena teve mediação do Antropólogo Henyo Barreto (Universidade de Brasília) e fez parte das comemorações de 25 anos do ISA.
Por Roberto Almeida, do ISA
Matéria publicada originalmente no site do ISA em 23/07/2019.